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MAL-ESTAR, BRASIL
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“A terra do gozo sem culpa vira a terra do cinismo ilustrado”
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Coordenador: Paulo Arantes
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Debatem:
José Leon Crochik,
Vladimir Safatle,
Christian Dunker,
Laurindo Minhoto,
Tales Ab'Saber
e Mariane Ceron (mediadora)
Participação especial:
Maria Rita Kehl
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Dia 14 de dezembro Terça-feira, às 9h30
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Auditório da História/USP
Cidade Universitária
São Paulo
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Recomenda-se a leitura prévia do dossiê “O mal-estar do Brasil”, na revista REPORTAGEM nº 61 (outubro/2004), para aprofundamento da discussão no dia.
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Mais informações:
Danilo ()
ou Mari ()
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Realização
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Assinaturas da revista
poderão ser feitas no local
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Arquivo - Sexta-feira, 03 de dezembro de 2004 |
A retomada do crescimento da economia brasileira
FESTA EM BRIGA DE CACHORRO GRANDE |
Foi uma semana de euforia. O IBGE divulgou na terça-feira números bonitos sobre a economia brasileira. O Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 6,1% no terceiro trimestre de 2004 em relação ao mesmo trimestre de 2003, e 5,3% ao longo de 2004. Os jornais disseram que o presidente Lula ficou eufórico, radiante e feliz. O ministro da Fazenda, Antônio Palocci, convocou entrevista coletiva para dizer que esses resultados respondem aos críticos do governo; comprovam a retomada de um ciclo longo e virtuoso de crescimento econômico; confirmam o êxito de uma receita clássica, sem mágicas ou características exóticas. Para completar, os números desta semana gorda não podem ser tão relativizados quanto até outro dia o seriam, quando comparados com a variação de 0,2% negativa do PIB em 2003. Pois o IBGE também refez as contas do ano passado e anunciou que o país não deu marcha-à-ré, mas andou para frente, ainda que em modesto 0,5% positivo. Não se duvida dos cálculos do IBGE, nem se acredita que a revisão de 2003 tenha sido feita para dourar mais a pílula. O Instituto certamente honra sua história ao apresentar sua nova formula para aferir a riqueza que o país produz. E muito menos se deve dizer que a alegria no governo é falsa. Mas é preciso colocar a bola no chão. Palocci exagerou. Lula idem. A imprensa, nem se fale!
O desempenho das exportações brasileiras e o superávit da balança comercial acumulado no ano de US$ 30,1 bilhões estão na base dos números comemorados na semana. Os números da semana, portanto, tem relação direta com os humores da economia e da política internacional, que parecem fincados em posição favorável ao Brasil. Mas não estão. Há sinais de instabilidade.
O noticiário econômico das últimas semanas tem sido freqüentado embora longe das manchetes pelos comentários temerosos do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, a respeito da acentuada tendência de desvalorização do dólar frente ao euro. Nesta quinta-feira, após a reunião do Conselho Supervisor do BCE que decidiu manter a taxa básica de juros em 2% ano, Trichet manifestou mais uma vez sua preocupação. Nos últimos 12 meses, o euro valorizou-se 11% em relação ao dólar 7% apenas de outubro para cá. No dia da reunião do BCE, a cotação da moeda européia bateu outro recorde: US$ 1,3383. Trichet repetiu que essa movimentação era desagradável e disse que "nunca" comentaria sobre intervenção cambial. Mas dizer nunca é um perigo, ele sabe!
A taxa básica de juros na Europa está em seu patamar mais baixo nos últimos 60 anos e, nem por isso, a economia consegue deslanchar. "Não examinamos cortes de juros. Examinamos outras opções [alta ou manutenção] quanto a eles", disse Trichet. "Nossa conclusão, por uma maioria bastante grande, era de que as taxas de juros estão no ponto correto, no momento, e que era essencial manter a vigilância." Vigilância sobre o quê? Sobre a inflação (que aponta para cima) e, principalmente, sobre o câmbio.
Em penúltima instância, o câmbio expressa a correlação de forças entre duas economias no caso, a da União Européia (UE) e a dos EUA e em última instância expressa uma correlação de forças políticas. É algo que vai além da simples comparação do Produto Interno Bruto (PIB) de cada parte, mas sim do porte das vontades e interesses e dos instrumentos políticos que cada parte dispõe para executá-los. E, de fato, a Europa está acuada.
O comunicado do BCE após a reunião que manteve os juros anunciou uma redução da projeção de crescimento da economia na zona do euro em 2005 para uma média de 1,9%, contra os 2,3% previstos em setembro. É a Europa rica mandando dizer que está com freio de mão puxado. O oposto da felicidade que se vê no governo brasileiro.
Parece claro que a decisão do BCE foi fortemente influenciada pela valorização do euro. A recuperação econômica da zona do euro, que até o ano passado vinha sendo puxada pelas exportações, está em risco. A desaceleração do crescimento da economia mundial também prejudica as exportações da Europa. No dia 30 de novembro, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) reduziu de 3,3% para 2,9% sua estimativa para o crescimento mundial em 2005. É de se ficar com um pé atrás.
Trichet não fala por conta própria. Ministros de finanças da UE também têm insistido nas ultimas semanas que os EUA devem tomar providências para valorizar sua moeda e conter seus déficits fiscal e em conta corrente. De outro modo, dizem os europeus, a valorização do euro terá conseqüências negativas na recuperação da economia do continente. Se a Europa unida percebe um perigo à frente, o que há a espera do Brasil?
Na Folha de S. Paulo desta quarta-feira o deputado federal Antônio Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda de governos militares nos anos 70 e 80, dá uma pista interessante. Ele está acostumado com o vai-e-vem do câmbio desde quando os EUA mandaram às favas, no começo dos anos 70, o acordo de Bretonwoods que estabeleceu o regime de paridade fixa entre as principais moedas do mundo após a Segunda Guerra. Delfim mostra um gráfico com a variação do valor efetivo do dólar frente a um pacote das mais importantes moedas dos países industrializados. Nele se vê que, desde 1975, o dólar flutua amplamente: Valorizou-se fortemente entre 1979 e 1985; retornou ao nível anterior entre 1985 e 1987; estabilizou-se entre 1987 e 1995; valorizou-se entre 1995 e 2001 e desvalorizou-se fortemente nos últimos 30 meses. Diz ele que a rápida desvalorização do dólar chama hoje mais atenção do que no passado justamente por causa da existência do euro.
O que há de diferente hoje, diz Delfim, é que os EUA são o maior devedor mundial cerca de 35% do seu PIB, de US$ 10,9 trilhões! O déficit em conta corrente em 2004 será de cerca de US$ 600 bilhões, quase 6% do PIB. Os asiáticos que têm um enorme volume de comércio com os EUA mantêm suas moedas subvalorizadas e financiam, com o aumento das suas reservas, parte do déficit americano. Construiu-se uma espécie de 'moto-contínuo', cuja duração e equilíbrio são incertos, diz o deputado. No Brasil, temos tentado atribuir toda a valorização do real nos últimos meses à imagem no espelho da própria desvalorização do dólar. Estaríamos, portanto, diante de um fenômeno aritmético sem maiores conseqüências para nosso equilíbrio externo no longo prazo. Trata-se de um evidente equívoco, pois o nosso poder de competição não depende da relação com o dólar nem mesmo no mercado americano. Nossa capacidade de competir no mundo (e, conseqüentemente, também no mercado americano) depende de nosso câmbio relativamente aos dos nossos competidores. Desse ponto de vista não existe nenhuma evidência de que estejamos caminhando corretamente.
Sem entrar no mérito de uma possível receita de Delfim, o fato é que ele ajuda a mostrar que o Brasil está no meio de uma briga de cachorros grandes. O que seria melhor, portanto? Dizer que os números corados desta semana feliz são apenas o começo da festa prometida ou manter o rabo entre as pernas?
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