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MAL-ESTAR, BRASIL
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“A terra do gozo sem culpa vira a terra do cinismo ilustrado”
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Coordenador: Paulo Arantes
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Debatem:
José Leon Crochik,
Vladimir Safatle,
Christian Dunker,
Laurindo Minhoto,
Tales Ab'Saber
e Mariane Ceron (mediadora)
Participação especial:
Maria Rita Kehl
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Dia 14 de dezembro Terça-feira, às 9h30
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Auditório da História/USP
Cidade Universitária
São Paulo
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Recomenda-se a leitura prévia do dossiê “O mal-estar do Brasil”, na revista REPORTAGEM nº 61 (outubro/2004), para aprofundamento da discussão no dia.
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Mais informações:
Danilo ()
ou Mari ()
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Realização
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Assinaturas da revista
poderão ser feitas no local
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Arquivo - Quinta-feira, 02 de dezembro de 2004 |
Os documentários Peões, de Eduardo Coutinho, e Entreatos, de João Moreira Salles
DUAS VISÕES DE LULA |
Que operário chegou ao poder no Brasil? João Chapéu, que, como muitos dos militantes das grandes greves dos anos 70, foi demitido e, desde então dirige um táxi? Miguel, sanfoneiro que montou um salão de forró, mas com o crescente desemprego foi à falência? Lula, que usava macacão e jogava bola no almoço? Ou Lula, cercado por assessores, correligionários, marqueteiros, que apara a barba e dá entrevista pelo celular ao mesmo tempo, que debate na TV e, em campanha, não tem mais espaço para momentos privados? Todos eles? A resposta parece estar em dois documentários que registram os pontos de partida e de chegada da história do operário que se tornou presidente da República: Em Peões, de Eduardo Coutinho, o sindicalista é parte da complexa trama da vida operária dos últimos 20 anos; em Entreatos, de João Moreira Salles, o político vitorioso é o centro. É como os apresenta o crítico de cinema Leandro Saraiva na próxima edição de REPORTAGEM, que circulará em dezembro.
Talvez o centro do filme realizado por Eduardo Coutinho, diz Leandro, esteja na indagação sobre onde está a história: Na massa que lotava o estádio da Vila Euclides, registrada em fotos e filmes para a posteridade? Ou em cada um daqueles rostos do grande coral: "este aqui é o Carrapicho!", "esta é a Elza, da Polimatic". Esse foi o dispositivo utilizado para realização do filme: os entrevistados emergem das massas anônimas dos documentos históricos, passados em revista pelos antigos companheiros. Contam a história que ajudaram a fazer, mas cada um conta a sua própria história. Não apenas no sentido banal dos múltiplos pontos de vista, mas no sentido mais profundo e difícil da realização da história coletiva em cada vida particular.
Uma certa nostalgia é inevitável. Afinal, cada um tem que se confrontar com imagens, em geral, de sua juventude. Junto com as greves que abriram caminho para a democratização, também é posto em foco o que já foi, o que poderia ter sido, e o que não foi feito em cada história pessoal. Enock vê no vídeo a mulher, já falecida; Elza diz que guardou uma revista da época, onde aparecia, para mostrar para os filhos, mas, como não teve filhos, mostra para os sobrinhos. Se estão presentes essas feridas e alegrias particulares a cada um, cada um as viveu e, no filme, as conta sob a perspectiva da coletividade. Não só do antigo movimento das grandes greves, mas também da percepção da erosão daquela situação que pôs a classe operária numa posição de protagonista. Quase todos os entrevistados tinham vindo do interior nordestino e, aposentados, muitos para lá voltaram. Hoje, poucos têm filhos operários, e esses poucos são operários muito diferentes dos de 20 anos atrás, trabalhando num contexto de informatização intensa, desemprego e exigência de estudo formal. Não foram apenas os operários que envelheceram. Também a própria classe operária saiu de cena. Isso não é dito explicitamente por ninguém, mas impregna a fala de quase todos.
Em Peões, não há vida contada que não seja vivida de modo intensamente social. É um filme que nos leva a meditar, junto com os entrevistados, sobre o caminho percorrido de 1979 até hoje. Lula é um elemento a mais na complexa trama da vida. Já em Entreatos, Lula é o centro. João Moreira Salles, seu diretor e também proprietário da produtora Videofilmes, concebeu visando complementar a revisão da história por sua conseqüência no presente , a realização de Entreatos e Peões como um projeto conjunto, no qual um filme pudesse iluminar o outro. E consegue.
Entreatos documenta as últimas semanas da campanha presidencial vitoriosa. Segue Lula dia e noite, nos "camarins e quartos de hotel, aviões e comícios", como diz o diretor na locução da abertura. João Salles filma como um observador. Lula aparece no filme à vontade, esbanjando simpatia, carisma e inteligência. Sai do discurso para a piada em fração de segundos, comunica-se com desenvoltura com jornalistas estrangeiros e com uma amiga manicure. Há quem se choque com o artificialismo e a importância do marketing político no filme. De fato, Duda Mendonça e sua equipe dirigem Lula em vários momentos (o mais contundente, provavelmente, é o do último debate, quando é transmitido ao candidato o que deve ser dito, em função dos resultados da pesquisa qualitativa em tempo real que nos é mostrada, no lugar do debate). Mas o diretor buscou flagrar o lado humano da jornada. Para a história, Lula nunca foi um rosto anônimo. Para o próprio Lula, estar no centro e no ápice significa assumir o risco de deixar de ser o que sempre foi.
É sintomático que a única pergunta que João Salles dirija a Lula seja "você nunca tem vontade de ficar sozinho?" Lula tem lucidez sobre sua condição e diz que isso não é mais possível para ele. Ser um homem público, e em campanha, não deixa espaço para momentos privados. Pelo menos não frente às câmeras, mesmo que se trate aqui da câmera de um documentarista interessado nos sutis movimentos da alma. Talvez a busca de uma dimensão pessoal não seja iluminadora no caso de um político. Restrito a essa busca, Entreatos revela pouco da política brasileira contemporânea quase nada, exceto o que já sabemos todos: um operário autêntico chegou à Presidência. Porque, para quê, com quem, não pareceu oportuno ao candidato ou aos seus companheiros discutir em frente à câmera. Posição com a qual o cineasta, respeitosa e infelizmente, concordou.
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