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    Arquivo - Quarta-feira, 16 de fevereiro de 2005
A revelação do programa dos EUA para substituição das armas nucleares antigas por novas

FAÇAM O QUE DIGO, NÃO O QUE FAÇO
O noticiário cotidiano mostra o esforço do governo dos EUA naquilo que os americanos chamam de política de não-proliferação nuclear. Para os menos avisados, trata-se de uma regra de não-proliferação de armas nucleares válida somente para os países que, oficialmente, não as detém e que aderiram ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP). Os aderentes se comprometem a não empregar energia nuclear a não ser para fins pacíficos e a permitir a vigilância contínua de suas instalações pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão das Nações Unidas. EUA, Rússia, França, Reino Unido e China, que já possuíam arsenais nucleares por ocasião da entrada em vigência do TNP, não precisam obedecê-lo.

Também não estão sujeitos às regras do TNP países que admitem possuir armas nucleares, mas não aderiram ao tratado – Índia e Paquistão são exemplos clássicos. Há ainda países que não admitem possuir tais armamentos, mas que seguramente os têm, e que também estão fora do tratado, como é o caso de Israel, que, estima-se, seja atualmente a quinta potência nuclear do planeta (ver Aqui mora o perigo, em REPORTAGEM nº 62, de janeiro de 2005).

Há também países signatários do TNP sobre os quais recaem desconfianças, sobretudo de americanos e europeus: se não têm a bomba, estão a caminho de obtê-la. É o caso do Irã – que negocia com França, Alemanha e Reino Unido – cujo governo já reafirmou diversas vezes que desenvolve tecnologia nuclear para uso pacífico. Enquanto conversa com os europeus, o regime de Teerã é constantemente fustigado pelos americanos, que vêem seu programa nuclear como uma ameaça à estabilidade no Oriente Médio.

E há a Coréia do Norte, que denunciou o TNP no início de 2003 – portanto, não está mais sujeita ao controle da ONU – e estava envolvida em negociações com a China, a Coréia do Sul, os EUA, o Japão e a Rússia, das quais se retirou por tempo indefinido há poucos dias. No comunicado emitido no último dia 10, em que anunciou seu desligamento dessas conversações sobre a questão nuclear na Península Coreana, o governo de Pyongyang avisou também que já desenvolveu armas nucleares como forma de proteção contra ameaças de agressão que sofre dos americanos – o país faz parte, com o Irã, do "Eixo do Mal", conforme o definiu o presidente americano George W. Bush no início de 2002. E também foi chamado de "posto avançado da tirania" há poucos dias pela secretária de Estado, Condoleeza Rice.

Como se percebe, os EUA têm um "duplo padrão" quando se trata da questão nuclear. Senão, como explicar as atitudes agressivas contra iranianos e norte-coreanos e complacentes em relação a Índia, Paquistão e Israel?

A preocupação com a proliferação nuclear por parte dos americanos parece ter mais a ver com o tipo de relação política mantida com os países do que com o perigo que as armas representam. Se de fato estivessem sinceramente empenhados na não-proliferação, os EUA não agiriam da forma como relata um artigo publicado pelo New York Times no último fim de semana. O texto de William J. Broad fala do programa aprovado pelo Congresso americano em novembro passado para estudar a substituição de armas nucleares antigas por outras mais novas e confiáveis. "Originalmente, as cerca de 10 mil ogivas do arsenal americano tinham uma expectativa de vida de 15 anos", mas "a idade média agora é de 20 anos e algumas são muito mais antigas", diz o artigo.

Trata-se, portanto, não de reduzir o arsenal, como se pode depreender do espírito do TNP, tão defendido pelos EUA quando se trata de nações menos poderosas, mas de mantê-lo. Broad fala de um programa ainda relativamente pequeno – de cerca de US$ 9 milhões – que emprega menos de 100 pessoas nos laboratórios de armas nucleares de Los Alamos, Lawrence Livermore e Sandina. A expectativa, diz ele, é que o programa "cresça e produza projetos acabados nos próximos 5 ou 10 anos". A proposta é trocar as ogivas nucleares pequenas e leves produzidas nos últimos anos – mas de durabilidade duvidosa – por outras mais pesadas e confiáveis.

Segundo John R. Harvey, diretor da Administração Nacional de Segurança Nuclear, órgão que supervisiona o arsenal nuclear americano, mencionado pelo articulista, a meta do novo programa é criar armas que sejam não apenas "inerentemente confiáveis", mas também mais fáceis de fabricar e certificar sua potência. Broad conclui seu artigo mencionando a preocupação de defensores do controle de armas, que citam, ao que parece com razão, o novo programa como desnecessário e como um fator que pode provocar nova corrida armamentista. O comportamento dos EUA evoca o dito popular, invariavelmente utilizado por quem é pego em contradição entre seus atos e palavras e que diz: "faça o que digo, não o que faço".


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