O sistema de Seguridade Social dos EUA A proposta de Bush para a reforma de uma Previdência que não está em crise
AMEAÇA FANTASMA PARA IMPOR SOLUÇÃO SALVADORA
O presidente Bush pretende privatizar a Seguridade Social, nome da Previdência pública nos EUA, argumentando que ela está prestes a entrar em colapso. Na verdade, segundo o semanário econômico inglês The Economist, as contribuições que sustentam a Previdência pública americana constituem mais de 25% das rendas obtidas pelo governo federal e os pagamentos das pensões representam mais de 20% dos gastos governamentais. Assim, de acordo com a revista, a Previdência está agora com superávit e o risco de déficit só ocorreria a partir de 2018, porque os americanos estão há tempos morrendo com idade cada vez mais avançada e tendo cada vez menos filhos. Mesmo com esse superávit, nos próximos treze anos, o semanário aprova a necessidade de reforma desde já antes que os chamados babyboomers, a geração provinda do grande aumento do número de nascimentos logo após a Segunda Guerra Mundial, cheguem à idade da aposentadoria, a partir de por volta de 2008. Mas a revista assinala que a privatização da Previdência não resolve de modo nenhum a vasta crise fiscal americana.
Bush fez uma concessão: não mexerá com os benefícios recebidos por pessoas com mais de 55 anos, nem lhes aumentará os impostos. A idéia da privatização é transformar um terço dos impostos sobre os salários em depósitos em previdência privada (isso num esquema voluntário, as pessoas não serão obrigadas a abrir contas de previdência privada). Em troca, os beneficiários que hoje têm menos de 55 anos passariam a receber pensões menores da Previdência pública. Para avaliar o que está em jogo, basta considerar que, para quase dois terços dos pensionistas, a Previdência pública representa mais da metade de sua renda.
O problema, ainda que se aceite que os rendimentos dos pensionistas não vão cair com a previdência privada, é que, a par de reduzir o dinheiro que sai da Previdência pública, o plano de Bush vai reduzir também o dinheiro que entra nela, situação praticamente impossível de resolver sem aumentar os impostos sobre salários. Para isso, a Casa Branca apresenta a proposta de, ao invés de indexar os benefícios aos salários, indexá-los aos preços, na suposição de que os preços em geral crescem menos do que as rendas individuais. Isso envolveria uma redução dos benefícios esperados da previdência privada. Além do mais, os custos operacionais da transição entre a Previdência pública e sua privatização parcial implicariam empréstimos governamentais de US$ 754 bilhões nos próximos dez anos.
Enquanto muitos congressistas democratas protestam incondicionalmente contra o plano, por dar um fim a uma das conquistas do New Deal há sete décadas e por "colocar em risco a relação de confiança dos cidadãos americanos em referência a seu Estado", outros, mais moderados, simplesmente propõem que a proporção dos impostos sobre os salários destinada à contribuições previdenciárias sejam aumentadas, em troca de um aumento desses impostos isso num esquema voluntário, não obrigatório.
Mas os contribuintes mais pobres, se quisessem aderir a esse esquema voluntário, podem necessitar de subsídios, o que de novo agravaria o fisco. O problema fiscal previdenciário, segundo The Economist, só seria resolvido com os aumentos dos impostos e o aumento da idade de aposentadoria, não sendo de nenhuma ajuda a privatização parcial proposta por Bush.
De todo modo, Bush não está encontrando dificuldades só entre a oposição democrata. Após semanas de intenso lobbying político, o próprio Bush reconheceu que não conseguiu grandes avanços sobre a Previdência, mesmo entre a maioria republicana. E o presidente do Federal Reserve (Fed, o banco central americano), Alan Greenspan, afirmou esta semana, em audiência na Comissão de Bancos do Senado, que a Previdência está necessitando, sim, uma reforma no sentido da privatização, mas "gradativa", e não "drástica", ao contrário do que propõe Bush. Isso porque, segundo Greenspan, os custos operacionais de uma reforma rápida seriam muito altos talvez uma referência aos US$ 754 bilhões citados pelo Economist.
Para muitos opositores, Bush está fazendo com a Previdência o mesmo que fez com o Iraque: apresenta uma ameaça fantasma (a existência de armas de destruição em massa no Iraque, o déficit da Previdência) para impor uma solução salvadora (a "guerra contra o terror" e "a sociedade em que todos sejam proprietários"), que só vai agravar a situação (com o atoleiro no Iraque e a diminuição dos benefícios previdenciários sem melhora do déficit fiscal).
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