A lista de Fatos reúne acontecimentos relevantes e é um ponto de partida para a Oficina de Informações. O bom jornalismo, que não dispensa um ponto de vista, deve, no entanto, partir dos fatos, tais como eles são, independentemente de nossos desejos e intenções.
A resposta do governo brasileiro à nota do Exército enviada ao Correio Braziliense a propósito da divulgação de fotos que seriam do jornalista Wladimir Herzog, morto em prisão militar em 1975
GOVERNO, APARENTEMENTE, DÁ RESPOSTA INDIRETA A NOTA DO EXÉRCITO QUE DEFENDE SUA ATUAÇÃO NO REGIME MILITAR
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A Radiobrás divulgou nesta terça-feira nota do secretário de Direitos Humanos do governo Lula, Nilmário Miranda, a propósito de matéria publicada no Correio Braziliense neste domingo, com fotos que aparentemente são do jornalista Wladimir Herzog, que morreu em uma prisão do Exército brasileiro em 1975, e nas quais ele aparece nu em uma cela. A nota do secretário Nilmário é aparentemente uma tentativa de o governo brasileiro fugir de uma resposta mais clara para a nota do Centro de Comunicação Social do Exército divulgada no fim de semana, em resposta à notícia publicada pelo Correio. Abaixo estão as íntegras das duas notas. E na nossa seção Ponto de Vista de hoje há um comentário a respeito.
A nota da Secretaria Especial dos Direitos Humanos:
“O sacrifício de Vladimir Herzog provocou uma grande onda de repúdio à tortura no Brasil. A divulgação da hipótese de suicídio gerou uma revolta e uma comoção inéditas no País. Foi, sem dúvida, um importante marco na luta contra a tortura. Paradoxalmente, a morte brutal do jornalista representou o início do fim de cinco séculos da marcha tenebrosa da tortura no nosso País e, assim, salvou muitas vidas.
Em 1988, a Constituição reconheceu a tortura como crime e, em 1997, a legislação nacional a tipificou como crime inafiançável. Hoje, a luta contra a tortura é uma política de Estado, que agrega governos, parlamentos, partidos políticos, entidades da sociedade civil etc.
Além disso, desde 1995 o Estado brasileiro vem reconhecendo a responsabilidade por mortes e desaparecimentos políticos. Recentemente, a Lei 10.875 expandiu as hipóteses de indenização, abrangendo a totalidade dos casos de mortes e desaparecimentos políticos no País. Desde que foi criada, a Comissão Especial já examinou mais de 390 pedidos de indenização de familiares de mortos e desaparecidos e acolheu 299 casos. E, até o momento, todos os indícios sobre localização de restos mortais de desaparecidos políticos foram alvo de buscas, pesquisas e investigações por parte da Secretaria Especial dos Direitos Humanos.
É dessa maneira que o governo brasileiro reafirma o compromisso ético e legal com as famílias dos mortos e desaparecidos políticos e com a história do Brasil, sempre norteado pelos princípios de reconciliação e de pacificação nacional.”
A nota do Centro de Comunicação Social do Exército:
1 – Desde meados da década de 60 até início dos anos 70 ocorreu no Brasil um movimento subversivo, que, atuando a mando de conhecidos centros de irradiação do movimento comunista internacional, pretendia derrubar, pela força, o governo brasileiro legalmente constituído.
À época, o Exército brasileiro, obedecendo ao clamor popular, integrou, juntamente com as demais Forças Armadas, a Polícia Federal e as polícias militares e civis estaduais, uma força de pacificação, que logrou retornar o Brasil à normalidade. As medidas tomadas pelas Forças Legais foram uma legítima resposta à violência dos que recusaram o diálogo, optaram pelo radicalismo e pela ilegalidade e tomaram a iniciativa de pegar em armas e desencadear ações criminosas.
Dentro dessas medidas, sentiu-se a necessidade da criação de uma estrutura, com vistas a apoiar, em operação e inteligência, as atividades necessárias para desestruturar os movimentos radicais e ilegais. O movimento de 1964, fruto de clamor popular, criou, sem dúvidas, condições para a construção de um novo Brasil, em ambiente de paz e segurança. Fortaleceu a economia, promoveu fantástica expansão e integração da estrutura produtiva e fomentou mecanismos de proteção e qualificação social. Nesse novo ambiente de amadurecimento político, a estrutura criada tornou-se obsoleta e desnecessária na atual ordem vigente. Dessa forma, e dentro da política de atualização doutrinária da Força Terrestre, no Exército brasileiro não existe nenhuma estrutura que tenha herdado as funções daqueles órgãos.
2 – Quanto às mortes que teriam ocorrido durante as operações, o Ministério da Defesa tem, insistentemente, enfatizado que não há documentos históricos que as comprovem, tendo em vista que os registros operacionais e da atividade de inteligência da época foram destruídos em virtude de determinação legal. Tal fato é amparado pela vigência, até 08 de janeiro de 1991, do antigo Regulamento para a Salvaguarda de Assuntos Sigilosos (RSAS), que permitia que qualquer documento sigiloso, após a acurada análise, fosse destruído por ordem da autoridade que o produzira, caso fosse julgado que já tinha cumprido sua finalidade. Depoimentos divulgados pela mídia, de terceiros ou documentos porventura guardados em arquivos pessoais não são de responsabilidade das Forças Armadas.
3 – Coerente com seu posicionamento, e cioso de seus deveres constitucionais, o Exército brasileiro, bem como as forças co-irmãs, vêm demonstrando total identidade com o espírito da Lei da Anistia, cujo objetivo foi proporcionar ao nosso país um ambiente pacífico e ordeiro, propício para a consolidação da democracia e ao nosso desenvolvimento, livre de ressentimentos e capaz de inibir a reabertura de feridas que precisam ser, definitivamente, cicatrizadas. Por esse motivo considera os fatos como parte da história do Brasil.
Mesmo sem qualquer mudança de posicionamento e de convicções em relação ao que aconteceu naquele período histórico, considera ação pequena reavivar revanchismos ou estimular discussões estéreis sobre conjunturas passadas, que a nada conduzem." |
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